quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Eu já fui mais eu

   Nas coisas perdidas, esquecidas, achei uma fotografia antiga. Um, dois, três anos tavez.. E, se ela falasse, diria que sente desgosto de mim. Quase temi ao encarar-lhe, tão ameaçadora ela era! Seus olhos eram inquisidores, persuasivos, destrutivos, tinham algo que não sei bem explicar. Só sei que nos olhos daquela relíquia existia um brilho que hoje não mais se vê; um brilho inteligente, curioso, ávido, revolucionário, profundo, transparente. Era um brilho de personalidade.
   Hoje no que eu me tornei? Eu tenho um rosto para ver no espelho, eu tenho um rosto para que outros adulem e desejem. Eu tenho um tronco vazio. Nos meus olhos não há nenhuma emoção, nenhuma chama. Estão vazios. Completamente vazios. Como um objeto de vidro: belo e oco, sem nada mais por dentro, sem profundidade. Como águas inexplicavelmente claras sem nada ter abaixo para se contemplar. Não há nada dentro de mim. Eu já fui Poeta, eu já especulei sobre o mundo, eu já tive sentimentos e opiniões. Hoje eu sou apenas um objeto de vidro, um tronco oco, um rosto no espelho.
   E, se aquele retrato falasse,
              diria que sente desgosto de mim.


" I am no more! "
(" Eu não sou mais eu" - A Fera)

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